Aos 24 anos, a brasileira Luiza Almeida já pode ser considerada uma veterana no hipismo e em Olimpíadas. Em Pequim’2008, com 16 anos, ela colocou o seu nome na história do esporte como a atleta mais jovem a disputar os Jogos na modalidade e terminou em 39º lugar no adestramento. Em Londres’2012, ela voltou a representar o Brasil e ficou na 47ª posição. Agora, no Rio’2016, ela espera tirar proveito de tanta experiência para melhorar seus resultados individuais.
Mas quais são as regras do adestramento? A modalidade, pouco conhecida do grande público, terá nos Jogos, além de Luiza, os novatos João Victor Marcari Oliva, Giovana Pass, Pedro Tavares de Almeida e o cavaleiro reserva Manuel Tavares de Almeida.
A pedido do Superesportes, a brasileira contou como funciona esse esporte e ainda revelou curiosidades.
O adestramento é uma modalidade do hipismo ainda pouco conhecida no Brasil. Conte algo curioso sobre esse esporte.
O adestramento é muito parecido com o nado sincronizado. Os dois esportes têm a mesma regra, os primeiros dias de competição são reprises, já pré-selecionadas pela Federação, e o último dia é a reprise freestyle com música. As regras são muito parecidas, principalmente as do último dia. No nado sincronizado, eles têm pontuação do uso do local (no caso deles, a piscina) e de graus de dificuldade dos movimentos, assim como no adestramento. O julgamento é o mesmo do adestramento. Eu sei disso porque, em 2007, eu contratei a Andrea Curi, técnica do nado sincronizado feminino, para fazer meu freestyle para os Jogos Pan-Americanos. O adestramento e o nado sincronizado são dois esportes subjetivos, e não há muitos esportes como esses atualmente. O adestramento é ballet a cavalo e o nado sincronizado é ballet aquá tico. São muito similares. A planilha que os juízes utilizam nos dois esportes é do mesmo tipo: como foi o uso da arena, a dificuldade dos movimentos, a escolha da música. Enfim, é muito interessante.
São três as provas que envolvem o adestramento. Como elas funcionam?
A prova de adestramento é dividida em três dias de competição. Nos dois primeiros dias, é a reprise (coreografia), já conhecida anteriormente pelos cavaleiros; e todos fazem a mesma reprise. A reprise do primeiro e segundo dia é feita pela FEI (Federação Equestre Internacional), que a encaminha a todos os cavaleiros. Nessa reprise, estão as orientações do que o cavaleiro deve fazer. É uma ordem de exercícios pré-selecionados. São movimentos obrigatórios e, no final, quem tiver a porcentagem mais alta é campeão. Nesses dois primeiros dias, não tem música, somente uma música de fundo para não ficar monótono. Mas não há coreografia com música. A medalha por equipe sai depois do segundo dia. São adicionadas as notas de todos os cavaleiros do primeiro e do segundo dia. Sai a média, por cada equipe, e aí a medalha por equipe. E no terceiro dia, a prova de estilo livre, sai a medalha pelo individual. O último dia é a prova de estilo livre (freestyle), onde cada cavaleiro faz a sua própria reprise e, aí sim, entra a música.
É o cavaleiro que produz sua própria música para a prova de estilo livre? Ou ele pode escolher em uma lista de músicas já pré-selecionadas?
Os cavaleiros podem escolher qualquer música, desde que ela combine com as andaduras do seu cavalo. Por exemplo, se temos um cavalo que é maior, ele tem um andamento um pouco mais lento, então, escolhemos uma determinada música. Quanto mais harmônica a música estiver com seu cavalo, mais bonito e bem feito vai ser seu freestyle. A escolha da música e o desenho da reprise valem nota, também são julgados pelos juízes. A partir dessa escolha, temos uma nota artística no final. Por isso, a combinação da música com o cavalo que o cavaleiro está competindo é muito importante. Não se deve fazer o freestyle e usá-lo com outro cavalo, pois as batidas de cada animal são muito individuais.
Durante essa prova, existem movimentos obrigatórios que temos que colocar na nossa reprise, mas podemos colocá-los na sequência que quisermos. Eu, por exemplo, tento sobressair o que meu cavalo faz de melhor e esconder o que ele não faz tão bem. É uma prova de estratégia e é muito linda de se ver. É como se fosse um ballet.
E como vocês formam essa sintonia entre a música e as andaduras do cavalo?
Para a prova de estilo livre, primeiro desenhamos nossa reprise, ou seja, temos que fazer o desenho da nossa própria prova, o caminho que o cavalo vai percorrer, para depois colocar a música em cima. Em seguida, filmamos e depois enviamos a um músico (um profissional de freestyle) para ele montar o freestyle em cima desse vídeo. No meu caso, eu começo escolhendo músicas do meu agrado e que combinem com a batida (passo) do meu cavalo. E sempre com auxílio do meu técnico. E com apoio da minha família. Fazemos um brainstorm juntos.
Existe uma equipe de especialistas que montam esse freestyle para adestramento no Brasil?
Existem algumas pessoas no Brasil que fazem isso, mas o número é pequeno em comparação com outros países. Existem diversos sites internacionais em que você pode comprar Kür (freestyle, em alemão) já pronto para, por exemplo, iniciantes, que não precisam gastar dinheiro para isso, em provas de nível não olímpico. O cavaleiro também pode mandar ao profissional de freestyle seu vídeo em que faz a reprise com seu cavalo, e o profissional monta a música em cima daquele vídeo. O profissional consegue ver a batida do seu cavalo por vídeo e fazer isso via internet.
Que tipo de música é utilizada? Pode ser qualquer ritmo? Já houve alguma escolha de música inusitada na história do adestramento?
Podemos usar qualquer ritmo, o mais importante é a música estar no mesmo ritmo do nosso cavalo. O cavaleiro deve pensar também em quem está julgando, no que os juízes vão gostar de ouvir. Eles são mais tradicionais. Uma sugestão é optar por música mais clássica e tentar ouvir freestyle de músicas daqueles que já foram campeões. Uma história de freestyle curiosa de que eu lembro foi quando a cavaleira holandesa Anky Van Grunsven, que foi diversas vezes campeã olímpica, fez num Kür com tango e se tornou campeã. Todos se emocionaram.
Na história da prova de estilo livre, já houve fatos inusitados e inesperados?
Nas provas de freestyle, sempre acontece alguma coisa engraçada. Já aconteceu de o CD travar no meio da prova e o cavaleiro ter que começar tudo de novo. Uma vez, durante minha participação em uma prova, colocaram para tocar o freestyle que era destinado a outro cavalo que eu tinha (risos). Essas confusões sempre acontecem. Por isso que é muito importante, antes da competição, fazermos o chamado soundcheck, que é a verificação do som, para ver se está tudo certo, se o CD está rodando, se tem USB, verificar a altura do som etc. Mas, apesar disso, sempre acontece alguma coisa, é desesperador (risos)
Olimpíadas 2016