Presidente da Câmara de Equinocultura, Flavio Obino Filho, rebate críticas de artigo do editor da Revista Horse
Presidente da Câmara de Equinocultura, Flavio Obino Filho, em discurso na Audiência Pública que tratou do controle da suposta zoonose – mormo; (Foto: Reprodução/ crmv-mt)
Em artigo apócrifo publicado no site da Revista Horse, posteriormente assumido pelo seu editor Marcelo Matrobuono, fui ofendido, acusado de irresponsável, insensato, de não representar o setor da criação do cavalo, e de ter um “defeito de ordem genética”. Lamentavelmente neste assunto que envolve o mormo as discussões lembram fogueiras de muito mais calor do que luzes. O emocional aflora, como não poderia deixar de ser, nas manifestações dos diretamente envolvidos. A desinformação é uma constante e mentiras são repetidas e viram verdades. Perdoando generosamente o articulista pelas ofensas e olhando para frente nesta batalha do setor produtivo contra o mormo, espero ter condições de democratizar informações e contribuir para a melhor compreensão das políticas públicas de enfrentamento da doença.
Inicialmente registro que sou pequeno criador e proprietário de cavalos, gerando na minha atividade 12 empregos diretos e aproximadamente 40 indiretos. Possuo cerca de setenta cavalos de corrida e um bom número de animais de trabalho e lazer. Conheço bem as agruras da atividade que deve ser vista como de natureza econômica e não como mero hobby como buscam rotular os detratores da atividade.
Não tenho a pretensão de ser conhecido por todos os exercentes da atividade, mas hoje presido, em meu segundo mandato, a Câmara Setorial da Equideocultura do MAPA. Fui eleito, nas duas vezes, por unanimidade pelos representantes das seguintes associações com assento no órgão: Confederação Nacional da Agricultura, Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Crioulo, Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo de Corrida, Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Mangalarga Marchador, Associação Brasileira do Cavalo Mangalarga, Associação Brasileira dos Criadores do Cavalo Quarto de Milha, Associação Brasileira dos Veterinários de Equinos – ABRAVEQ, Jockey Club Brasileiro e Confederação Brasileira de Hipismo. Assim, quando me pronuncio, falo em nome destas associações, respaldado por um Grupo Técnico coordenado pela Abraveq. Falo em nome de um setor com uma tropa de 5 milhões de cavalos que movimenta anualmente R$ 16,15 bilhões e é responsável por 610 mil empregos diretos e 2 milhões e 400 mil indiretos, ou seja, mais de 3 milhões de postos de trabalho.
O combate ao mormo é a prioridade do setor. A doença existe e hoje está espalhada em todo o território nacional. Mente quem diz que não temos mormo. Já houve isolamento da bactéria e/ou detecção de fragmentos genéticos desta pelo método de PCR em diversos estados do país – SP, RJ, ES, SC e PE. A prevalência é baixa, mas seria muito maior se a tropa toda fosse testada. O rebanho está exposto por deficiência no controle do transito de animais, sendo certo que temos um exército de equinos que transitam por interesse de seus proprietários sem a documentação oficial e os exames obrigatórios.
O setor foi desafiado pelas autoridades sanitárias há cerca de 5 anos para que não impedíssemos sacrifícios através de ações judiciais. Na oportunidade, já como Presidente, me posicionei no sentido de que o setor produtivo seria parceiro se tivesse segurança de que o animal a ser sacrificado estava infectado. Ninguém quer na sua propriedade um animal com mormo, mas um teste de campo e subjetivo como o da maleína, mesmo validado pela OIE, não nos dava segurança.
Realizamos um seminário nacional, com as principais autoridades nacionais, e concluímos que mesmo sendo oneroso quando comparado aos outros dois exames o WB teria que ser usado como contraprova no lugar da maleína. O setor também apontou como meta que as desinterdições fossem mais céleres e que ficassem restritas a parte da propriedade ou mesmo a uma cocheira, caso fosse atestado pela autoridade local o isolamento seguro. Nova etapa se iniciou com conversações com as autoridades sanitárias do MAPA chegando-se a proposta de um novo marco legal. A normativa que abandona a maleína e adota o WB como teste de contraprova foi por duas vezes colocada em consulta pública e o texto foi negociado com o setor produtivo a cada adequação ou modificação.
Estou convencido – esta é uma opinião pessoal – de que o Lanagro Pernambuco, até pelo número de testes realizados, talvez seja o laboratório com a maior expertise no globo terrestre para a realização dos testes de WB. O WB está sendo adaptado para o diagnóstico do mormo no Brasil, com ajustes ao longo desta caminhada. Assim, as propostas de que enquanto esta adaptação não acontece os testes devem ser encaminhados para laboratórios estrangeiros não resiste ao debate. Se precisamos nos adaptar, por óbvio um laboratório estrangeiro teria uma caminhada ainda muito maior para se adaptar a nossa realidade e no estágio atual seus testes seriam menos seguros dos que os nossos. Ainda sobre este tópico, é claro que não podemos manter um programa baseado em um único laboratório, pelo que estamos envidando os maiores esforços (setor produtivo) para que o Lanagro RS e o laboratório oficial de Goias também sejam estruturados para a realização dos exames.
Como o setor produtivo apoia o WB e o MAPA concorda que o teste laboratorial é infinitamente mais seguro do que o da maleína, mesmo com o marco legal prevendo a maleína como exame complementar, o WB foi adotado, na prática, como teste de confirmação com o nosso total apoio. Infelizmente, em episódios judiciais, partes interessadas passaram a alegar que o WB não era válido porque não estava previsto expressamente na normativa. Alguns estados recuaram e retomaram a maleína em razão desta insegurança jurídica. O Rio Grande do Sul é um exemplo. De outra parte, também na esfera judicial, proprietários questionam a maleína por sua subjetividade. As discussões judiciais, regra geral, impedem a desinterdição postergando ad eternum o saneamento da propriedade. O produtor que se lança na aventura judicial e que depende do transito de animais, adota medida burra, porque autofágica, mas perfeitamente compreensível no quadro de insegurança jurídica.
A nossa luta – de todo o setor produtivo até o seu último pronunciamento oficial – é pelo WB como exame de confirmação. Mesmo sabedores da insegurança jurídica seguimos insistindo para que ele seja adotado mesmo antes da publicação da nova normativa.
A fotografia atual, contudo, a par de toda esta questão judicial, é de ausência do reagente para a realização do WB no país. Como testamos muito, o laboratório alemão desde outubro não consegue mais atender a nossa demanda e nos engessa mais uma vez. O MAPA nos assegura que está em conversações para que a produção ocorra na América e que este problema seja resolvido. Assim, o que temos hoje é a maleína, validada pela OIE e normatizada no Brasil, mas em descrédito.
Lamentavelmente no dia de hoje (2 de março) não temos escolha. Feito o teste de triagem (fixação de complemento) e sendo ele positivo, a confirmação somente pode ser feita pelo exame de maleína. Que alternativas temos? Manter a interdição da propriedade até que tenhamos o WB? Aceitar o teste de triagem como definitivo (2/3 são falsos positivos)? Abrir a porteira e deixar cavalos com teste de triagem positivo circularem? Nenhuma destas soluções atende o setor produtivo. Assim, a maleína, hoje, é o que temos, pensando no conjunto dos produtores de cavalo brasileiro, na proteção do rebanho nacional e no controle de uma zoonose.
Quanto à alteração da norma, temos o compromisso do MAPA de que ainda nesta primeira quinzena de março receberemos na Câmara a última versão para publicação. O nosso grupo técnico coordenado pela ABRAVEQ examinará a proposta e caso necessário apontará alterações. Nossa expectativa é de que em março tenhamos uma nova normativa e que o WB possa ser adotado como teste de confirmação.
Várias outras ações estão sendo tomadas pelo MAPA e acompanhadas pela Câmara de Equideocultura. Já foi determinado pelo MAPA que todos os animais sacrificados sejam necropsiados para isolamento da bactéria e sequenciamento genético. Infelizmente alguns estados não estão seguindo a recomendação. Na área da pesquisa, o MAPA está com cavalos infectados e isolados em Cananéia desde o final do ano passado em um projeto pioneiro de estudo da doença. Os avanços nas pesquisas serão apresentados a Câmara de Equideocultura na próxima reunião que se realizará em Campos do Jordão, durante congresso da Abraveq.
O controle do transito de animais é o funil principal para o combate da doença. Precisamos de rigor na fiscalização nos estados. Neste ponto defendo – posição particular – que só possam transitar animais chipados, munidos de GTA e de exames de anemia e mormo com validade de até 60 dias; e que a fiscalização se estenda a animais de trabalho que passam montados pelas barreiras estaduais. São propostas para debate.
Em derradeiro, realmente não meço palavras, sou transparente e corro sempre o risco de não ser entendido por aqueles que não têm a informação completa. Quando se fala em mormo, CAOS é a desconstrução do programa que estamos – setor produtivo e MAPA – colocando de pé; irresponsabilidade absurda é não controlar e não interditar. Quanto ao defeito de ordem genética, vou imediatamente marcar uma consulta com um geneticista!
Flávio Obino Filho
Criador de Cavalos
Presidente da Câmara de Equideocultura
Flavio Obino Filho